Dentro das fases do desenvolvimento humano, a adolescência talvez seja uma das mais complexas e delicadas. Quando se trata da pessoa no TEA não é diferente e hoje vou dar o meu relato como alguém que está dentro do Espectro do autismo e como pai de um adolescente Autista.
Meu nome é Fábio Cordeiro, Autista de nível 1, tenho 40 anos e por receber o diagnóstico apenas na vida adulta, passei minha adolescência sem saber que era autista. Tal fato é importante pois dá uma perspectiva um tanto quanto diferente em relação ao meu filho que já entrou na adolescência sabendo de sua condição.
Para mim realmente essa fase da vida não foi nada fácil. Desde muito cedo, antes mesmo de entrar na pré-escola, eu sabia que era diferente das outras pessoas, apenas não sabia o porquê. Eu sentia que não me encaixava nesse mundo, que tinha que mudar meu jeito de ser para poder me adequar. Algumas vezes eu conseguia disfarçar que estava entendendo tudo, que conseguia acompanhar a dinâmica de socialização dos grupos, pois principalmente na adolescência para ser aceito era muito importante que estivéssemos em grupos.
Mas logo eu perdia a velocidade de atualização em que estes grupos caminhavam. A rapidez com que tudo mudava, os gostos, as roupas, as opiniões. E parece que todos combinavam tão bem nessas mudanças enquanto eu gostava sempre das mesmas coisas e meus interesses eram os mesmos por muito tempo. O vocabulário deles era todo igual e eu falava de maneira diferente de todos.
Tentar disfarçar tanto para parecer igual cansava muito e no fim eu sempre perdia essa luta. Por mais que tentasse eu não conseguia e isso me fazia explodir. Fazia me afastar de tudo e de todos. E na fase da vida onde a socialização mais aflorava, foi onde eu fiquei mais antissocial. Não por vontade própria, mas sim pelo sentimento de incapacidade de adequação e por repetidas frustrações diante dos fracassos de tentativas em vão.
Como se tudo isso não bastasse, na adolescência é que emergem os interesses das relações afetivas. Pelo menos para mim foi assim. E se tem algum tipo de relação interpessoal que envolva mais sinais implícitos em que a comunicação social se apresente de maneira menos verbal e que exija um entendimento de escutar o que a outra pessoa não diz do que as relações afetivas amorosas na adolescência eu desconheço; e era justamente ali o meu maior déficit. Dava vontade de parar de viver!
Sim, tive vontade de parar de viver. O sentimento de não se encaixar, de não adequação e de culpa por tudo isso traz sofrimento. E para o adolescente, todo sofrimento é superestimado.
No caso do meu filho a perspectiva é um pouco diferente. Ele, como já dito, entrou na adolescência já ciente de seu diagnóstico e com algum entendimento de sua condição.
Isso quer dizer que é mais fácil para ele, que então tal fase da vida não demanda tanto cuidado ou tanta atenção? Absolutamente não!
Enfatizo que ainda assim essa fase continua sendo muito frágil e crítica.
A mudança de perspectiva se dá no sentido que, por já entender mais de sua condição, ele entende melhor os motivos que o fazem diferente dos demais. No meu caso eu me sentia errado, ele já sabe que não há erro algum em ser atípico e que ser diferente é normal. Ele compreende que a dificuldade de socialização acontece não por culpa dele. E aqui que temos o ponto chave da história dele enquanto adolescente autista. Percebam que por mais que ela tenha uma compreensão que eu não tive, a dificuldade de se enturmar não desaparece. E por que então?
Porque por mais que lá na minha época eu achasse que o problema estava em mim por não ser aceito, a verdade era que as pessoas em geral não aceitam bem as diferenças e os diferentes. E hoje em dia, infelizmente, pouco mudou nesse sentido. Vivemos numa sociedade que ainda tem que aprender muito sobre diversidade, que tem que aprender sobre acolhimento, uma sociedade em que pais tem que ensinar aos filhos a não rechaçar o estranho, o esquisito. Aliás, esquisito é não abraçar os divergentes.
Então, no resplendor dos seus 15 anos, assim como era no meu tempo, meu filho ainda não consegue ter muitos amigos, ainda não consegue estar inserido num grupo, ainda não é convidado para festas de aniversário ou qualquer outra festa. Ele sente-se excluído e muitas vezes ele é mesmo excluído.
A diferença está no fato que ele sabe que não há nada errado em ser como ele é. Está no fato de que ele tem um apoio não só dos pais (o qual eu tive também na minha época, mas que como muitos adolescentes eu não era dado a ouvir meus pais) como também de profissionais. E principalmente está no fato de ter um pai que por ver o espectro por dentro, luta todos os dias para que a sociedade evolua e nunca o faça ter a vontade de parar de viver!
Texto escrito por: Fábio A. Cordeiro, Autista, 40 anos | Funcionário Público Federal | Pai de dois meninos, um neurotípico e um autista | Colunista no vidadeautista.com.br | Membro da REUNIDA - Conselho do Autistas | Criador da maior página de humor autista do Brasil - @aspiesincero
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